Em Marana, no estado americano do Arizona, cerca de 30 milhas a noroeste de Tucson, existe um movimentado aeroporto público denominado Pinal Airpark. O aeroporto parece desproporcional a Marana, uma quente e ressequida cidade de apenas 35 mil habitantes, pois abriga uma enorme frota de aeronaves comerciais, incluindo muitos Boeing 747.
Aeronaves desativadas lotam o pátio do Pinal Airpark |
Entretanto, nenhuma companhia aérea opera regularmente em Marana. Não há esteiras de bagagem, nem grandes restaurantes, nem lojas e nem guichês de companhias. Mas não há silêncio, no entanto. Existe um ruído constante, e irritante, de poderosas máquinas industriais. Sua tarefa é reduzir aeronaves a pedaços. Pinal Airpark é, na verdade, um grande cemitério de aeronaves, local do último pouso de aviões que, por anos a fio, transportaram milhões de passageiros ou milhares de toneladas de carga durante sua vida útil.
Após a remoção dos trens de pouso, as aeronaves ficam apoiadas provisoriamente em pilhas de dormentes ferroviários de madeira |
A história do Pinal Airpark começa durante a Segunda Guerra Mundial. Construído para o Exército dos Estados Unidos em 1942 pelo Sundt & Del Webb Construction Companies, e inaugurado em março de 1943, essa instalação foi batizada como Marana Army Air Field. Durante a guerra, o aeroporto foi sede da 389th Army Air Force Base Unit, vinculada à AAF West Coast Training Center, cujo objetivo principal era formar nada menos que 50 mil pilotos militares para combater na Segunda Guerra Mundial.
Dezenas de grandes aeronaves lotam o aeroporto. Muitas jamais voarão novamente |
Originalmente, tinha 4 pistas, em um arranjo que lembra o número 4. Foi equipado com uma ampla infraestrutura que compreendia luz elétrica, encanamentos de água, esgoto e gás, além de hangares e outras facilidades. Um grande sistema de drenagem, em canais, foi construído para escoar a água resultante das torrenciais e repentinas tempestades que assolam constantemente o deserto do Arizona. Um ramal e uma estação ferroviária também foram construídos para servir a base.
Na linha da morte, um Boeing 747 e um 767 prestes a desaparecer por completo |
A principal unidade de treinamento baseada em Marana era a 3024th (Basic Training), que formava pilotos de aeronaves de transporte e navegação por instrumentos. Muitos pilotos chineses também foram formados em Marana. Como apoio à base principal, foram construídos no deserto cinco aeródromos auxiliares vizinhos, Picacho Aux # 1, # 2 Rillito Aux (atualmente utilizado com o nome de Marana Northwest Regional Airport), Coronado Aux # 3, Avra Aux # 4, e Sahuaro Aux # 5 (atualmente utilizado com o nome de El Tiro Gliderport).
Esse Boeing 747-400, o N185UA entregue novo à United em 1992, foi estocado em Marana em 2009 |
Com o fim da guerra, em 1945, o Marana Army Air Field, assim como centenas de outros campos de pouso espalhados pelos Estados Unidos, foi fechado e, praticamente, abandonado pelo governo. Simplesmente, não havia mais necessidade dele.
O N185UA, que, na verdade, nunca chegou a operar para a BlueSky, jamais voltou a voar, e foi para a linha da morte, com apenas 19 anos de uso, em 2011. |
Em 1948, a USAF, sucessora do Army Air Forces, repassou o direito de propriedade do Marana Army Airfield para o Condado de Pinal, depois de demolir a maior parte das instalações e infraestruturas militares construídas durante a guerra. O aeródromo fica na divisa entre os Condados de Pima e Pinal. O Condado de Pinal alugou o aeródromo para operadores civis, entre 1948 e 1951, e para a Darr Aeronautical Technical Company, uma escola civil de pilotos terceirizada pela USAF, entre 1951 e 1956.
Esse DC-10 foi cuidadosamente protegido da areia, visando seu provável retorno à ativa |
Durante a Guerra do Vietnan, Marana tornou-se a base doméstica de todas as operações aéreas da CIA - Central Inteligency Agency, que montou uma empresa aérea de fachada, a Intermontains Airlines, cujo principal objetivo, velado, era apoiar operações aéreas secretas da inteligência americana no Vietnan.
A estrutura do cockpit, ou mesmo o cockpit inteiro, são cobiçados por produtores de Hollywood |
Um dos engenhos mais interessantes testados em Marana foi o Skyhook Fulton (vejam o artigo sobre esse interessante equipamento aqui nesse blog: http://culturaaeronautica. blogspot.com.br/2009/09/ skyhook-um-estranho-aparelho- de-resgate.html).
Atualmente, o Pinal Airpark é utilizado por um empresa privada, a Evergreen, que instalou o Evergreen Aircraft Maintenance Facility, dedicado à manutenção de aeronaves temporariamente desativadas e desmonte de aeronaves retiradas definitivamente de serviço, além de conversão de aeronaves de passageiros para cargueiros e outras finalidades especiais. A Evergreen converteu, por exemplo, um Boeing 747-100 para avião-bombeiro, atividade que jamais deve ter sido imaginada por seus projetistas originais.
Esse Boeing 747-100 foi convertido para avião-bombeiro em Marana, sendo o maior avião desse tipo no mundo |
Como resultado dessa atividade da Evergreen, Marana recebe frequentemente aeronaves, a maioria de grande porte, para a morte. São aeronaves muito voadas, e cujo custo de manutenção e operação já não compensam. É caro manter uma aeronave comercial em condições de aeronavegabilidade, e esse custo vai aumentando com a idade da aeronave. Chega a um certo ponto que a aeronave já vale mais desmontada do que inteira, e aí o seu destino está selado.
Aeronaves desativadas aguardando o seu destino final |
Hoje, quase não existem mais aeronaves como Boeing 707 e Douglas DC-8 sendo desmontados. Esses praticamente não existem mais. Os aviões da vez são os Boeing 747-200, -300 e -400, 767, 757 e McDonnell-Douglas DC-10, além de Airbus A300 e A320.
As garras hidráulicas e as serras circulares motorizadas rapidamente convertem um antes poderoso 747 a uma pilha de metal |
Existem muitos cemitérios de aviões nos Estados Unidos. Podemos citar Mojave e Victorville, na Califórnia, Goodyear e Kingman no Arizona, e Opa-Loka na Flórida. Mas Pinal Airpark se caracteriza pelo desmonte de grandes aviões, como os Boeing 747 e os McDonnell-Douglas DC-10. De certa forma, é um tanto deprimente ver um avião desses chegar voando ao aeroporto e ser desmontado sem maiores cerimônias.
A preservação e a reciclagem de aeronaves fora de serviço é um negócio que movimenta bilhões de dólares anualmente nos Estados Unidos |
Hoje, o Pinal Airpark tem somente uma pista ativa, a 12-30, com 2088 metros de extensão. As demais pistas, do tempo da Segunda Guerra Mundial, são usadas como ponto de estacionamento de aeronaves. O clima seco do deserto preserva as aeronaves desativadas da famigerada corrosão intergranular do duralumínio, o maior fantasma das estruturas de avião. Embora se pense o contrário, muitas aeronaves que estão em Marana voltam a voar novamente, depois de uma preservação cuidadosa feita pela Evergreen.
Esse 747, antes operado pela Northwest, aguarda se destino final na linha da morte |
Depois de algum tempo estacionada, se a decisão do seu operador for pelo desmonte, todos os equipamentos úteis e valiosos são cuidadosamente removidos e colocados à venda, como motores, instrumentos, trens de pouso, APUs, aviônicos e outras peças. O restante da estrutura é pícado por tesourões hidráulicos, montados em veículos com lagartas, depois de limpos das partes de plástico e isolamentos térmicos, cujo destino é simplesmente o lixo. O metal picado é vendido para reciclagem, e sai de Marana em grandes caminhões-pranchas. É o fim do avião.
Dois Boeing 777-200, antes operados pela Varig, aguardam novo operador ou o tesourão |
Os militares ainda permanecem no Pinal Airpark. O aeroporto abriga o Silver Bell Army Heliport, base da Western Army National Guard Aviation Training - WAATS. A base é equipada com helicópteros de ataque AH-64 Apache, e é uma excelente base de treinamento, pois possui grande áreas planas e desertas e condições meteorológicas favoráveis durante praticamente o ano inteiro, além de estar cercada por aeródromos civis e militares muito bem equipados. Trinta por cento do movimento do Pinal Airpark é militar.
Na vista de satélite, as 4 pistas antes existentes são claramente visíveis |
Embora seja um aeródromo público, o Pinal Airpark e seu cemitério de aeronaves não é visitável. Os poucos turistas que se arriscam recebem um folheto de propaganda do Pima Air & Space Museum, na vizinha cidade de Tucson, e são convidados a se retirar. O Pima Museum não deixa de ser um ótimo programa, sem dúvida, mas a frustração de deixar de ver os grandes jumbos sendo desmontados é grande. Para quem vem voando, é possível pousar para abastecer no aeródromo e depois sobrevoar o cemitério a baixa altura, mas andar entre os aviões armazenados é praticamente impossível. Embora se trate de aeronaves desativadas, é um patrimônio consideravelmente valioso, e é justificável que seja cuidadosamente guardado e preservado da deterioração e de eventuais vandalismo. Definitivamente, o Pinal Airpark não é um museu. Se fosse, seria um dos mais visitados da região.
O Pinal Airpark ocupa uma área de 840 hectares no deserto. Atualmente possui uma única pista asfaltada de 2088 metros de comprimento e 46 metros de largura. Possui elevação média de 1893 pés. Sua designação ICAO é KMZJ, e na IATA é MZJ.
O Pinal Airpark ocupa uma área de 840 hectares no deserto. Atualmente possui uma única pista asfaltada de 2088 metros de comprimento e 46 metros de largura. Possui elevação média de 1893 pés. Sua designação ICAO é KMZJ, e na IATA é MZJ.
2 comentários:
Bela materia mestre , o que sai dali é tudo reciclado já vi um dbelo documentario sobre o local..
abs
Helio Mendonça
Olá, amigo, vc poderia citar a fonte do artigo, que é de minha autoria, e que veio do Blog Cultura Aeronáutica (http;//culturaaeronautica.blogspot.com). Obrigado.
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